Se aprofundando na história - Como era a vida dos alemães recém-emigrados ao Brasil?

Se aprofundando na história – Como era a vida dos alemães recém-emigrados ao Brasil?

O responsável pela primeira onda migratória alemã foi Dom Pedro I. Logo após a declaração da independência, em 1824, o monarca facilitou a entrada de estrangeiros da Confederação Germânica [nome da Alemanha à época]. Seu objetivo ao tomar essa atitude foi tanto explorar áreas pouco habitadas do Brasil, especialmente a região Sul, como torná-la uma região predominantemente ‘branca’ e ‘europeia’. Todavia, esse esforço já havia se iniciado antes – Dom João VI já legalizara a posse de propriedades fundiárias em 1808, demonstrando um interesse de incrementar populações de outras regiões que não Portugal na colônia.

Ao chegarem no Brasil, contudo, os alemães se depararam com algo diferente da expectativa – não somente o clima atrapalhou a sua assimilação, mas o isolamento e falta de apoio do império quando já no Brasil também.

Por que, então, essas ondas migratórias continuaram a existir? A princípio, até os anos de 1880 em diante a Alemanha não possuía colônias ultramarinas, em clara desvantagem frente a seus concorrentes econômicos e políticos europeus. Todavia, os alemães eram requisitados pelo Império Brasileiro devido à percepção de que eram bons trabalhadores e dedicados ao trabalho, seja qual fosse. As vantagens pareceram muito boas em sua descrição: passagem livre ao Brasil, terras sem custo, assistência com víveres, cidadania imediata, exceção de impostos e de serviço militar.

Esses grupos de alemães comumente se juntavam em colônias propriamente alemãs – como Leopoldina (BA), a primeira colônia para alemães no Brasil, São Leopoldo (RS), a primeira fundada no Sul, e a primeira que prosperou, Hamônia (SC), atual Ibirama, e mais posteriormente Rolândia (PR). A princípio tiveram de se estabelecer em áreas florestadas, longe dos campos inférteis, esquematizando suas comunidades em ‘Waldhufendörfer’, formas de estabelecimento rural que priorizam a expansão em linha reta, permitindo um acesso fácil aos elementos da terra circundante e à disposição das lavouras[6].

Muitos imigrantes conhecidos como “alemães do Volga” [Wolgadeutsche] que haviam se estabelecido no território do império russo a convite da imperatriz à época [Catarina, a Grande] também emigraram em quantidades significativas, e se depararam com uma desvantagem considerável frente às suas expectativas prévias – o solo ‘Chernozem’[7] da região sul da Rússia (especialmente na atual Ucrânia) era assaz fértil para o plantio, enquanto o solo dos campos no sul brasileiro eram caracterizados por uma terra infértil e imprópria para o plantio do trigo, principal cultura dos imigrantes.

No século XIX, portanto, muitos alemães que haviam emigrado da Alemanha tiveram de adaptar não apenas seu trabalho, mas seus costumes e relações com o meio-ambiente. De um lado, o governo precisava substituir a mão-de-obra escrava cada vez mais próxima da abolição, de outro os alemães, isolados, derrotados pelas guerras napoleônicas nos anos anteriores e sem perspectivas, que tiveram de se ajustar às necessidades da terra brasiliense.

No Sul brasileiro as primeiras colônias prosperaram – foram levados os alemães a barco após a chegada na capital Rio de Janeiro, e puderam se estabelecer nos lotes separados, construindo as primeiras escolas e igrejas das colônias. Enquanto pretendiam certamente continuar seus costumes no novo território, um dos primeiros choques de cultura foi a religião – para o Brasil da época, a única religião aceita era a Católica, o que impedia que esses alemães se candidatassem para cargos públicos, bem como significava que teriam que professar sua fé em ambientes descaracterizados de igrejas. À época o Brasil recém-independente também teve seus próprios momentos dramáticos, aos quais os alemães imigrantes acabaram sendo arrastados participando da Guerra do Paraguai e da Guerra da Farroupilha.

Nos dias de hoje a adaptação dessas comunidades a uma realidade própria pode ser observado claramente quando se vê o ensino da língua pomerana em Pomerode (SC), e o uso do dialeto Hunsrückisch, comum nos estados do Sul e Sudeste.

Guilherme Tavares Lopes Balau 

Mestre em História Social pela Universidade Estadual de Londrina (UEL),

 genealogista e consultor de cidadania alemã na Carraro Cidadania